JARDIM DA CASA CUBO
São Paulo, SP
texto Isabel Duprat
A casa projetada por Marcio Kogan é um bloco de concreto bruto, seco, exato como pretendia ser. Um monolito, como o nomearam. Pensei que, ao mesmo tempo que o jardim deveria selvagemente avançar na arquitetura como um contraponto da organicidade rebelde ao despojamento, também seria preciso respirar no espaço que lhe era destinado, circundado por edificações muito próximas em uma rua bastante estreita, e totalmente vazio, a menos de dois Ficus benjamina junto à rua.
Uma raia de 25 por 3 m, um requisito do cliente, determinou a espacialidade do jardim, uma vez que havia uma única localização possível para atender a estas dimensões, alternativas estas limitadas pelo subsolo e as suas aberturas. Em jardins urbanos, com exceções raras, a escolha do local da piscina, sobretudo se tiver a função da prática da natação, na maioria das vezes não é o lugar de insolação ideal, mas onde couber. A possibilidade de estar exposta ao sol, na melhor das hipóteses, não se dará ao longo das estações e tampouco ao longo do dia. Acrescente-se a isto, os muros de divisa, altas empenas e as construções vizinhas que já fazem sombra, as janelas alheias voltadas para o terreno, e, portanto, a necessidade de mitigar estes inconvenientes sem fazer uma bidimensional cerca viva ou um cenográfico jardim vertical. Há de se fazer escolhas. Como fazer um jardim com suas nuances de extratos da vegetação em seus diferentes portes e estruturas e cores, dar escala e temporalidade à arquitetura, desfrutar o ciclo de cada planta, criando um “lugar” a partir de um espaço vazio? Como criar assim um lugar que te acolhe, protege e interage atendendo a tantos requisitos? Faço a opção pelo “bom lugar” sempre, ainda que em detrimento de outros aspectos, porque é disto que precisamos.
Loquei a piscina na face norte a uma distância de 1,5 m da divisa, largura que considerei mínima para amenizar com vegetação a alta empena da casa vizinha, que se debruçava sobre o terreno e se avistava de vários pontos da casa. Um deck ligou a sala de estar à piscina formando um pátio dentro do jardim à beira d’água.
Na face oposta junto à rampa da garagem consegui a mesma largura para atenuar com plantas a vista da cozinha e as aberturas da casa ao lado.
Pouco tempo depois da obra terminada foi adquirido o terreno vizinho. Se a piscina tivesse sido projetada com esta área já incorporada, muito provavelmente a sua posição seria outra. Poderia ser construída mais distante da casa, aumentando a área de jardim entre a casa e a piscina com um afastamento maior do muro, ou mesmo locada na face oeste, que nesta nova situação acolheria suas medidas. No entanto, a situação já estava posta e não fazia nenhum sentido intervir na piscina pronta. Usei o pequeno deck de apoio à natação em uma de suas cabeceiras como passagem para o novo lote, e a linha d’água, que alcançava os seus limites, dividiu o jardim como um canal sangrando o terreno. A situação que se impôs resultou surpreendentemente agradável, criando um lugar de estar de onde se vê a casa por inteiro do outro lado da água, a outra “margem do rio”, e a piscina ganhou o espaço que precisava para ficar mais confortável no jardim. Esta experiência nos aponta que devemos sempre sair do conforto no momento da concepção de um lugar. Esta posição não era óbvia e seria difícil sustentá-la, mas era a melhor. Algumas plantas do lado de cá se repetiram do lado de lá, como ipês brancos, philodendrons e samambaias, fazendo a transposição visual. Com a demolição do muro, surgiu uma outra empena um pouco mais alta junto a qual foram plantadas altas árvores, triplaris e rodas de fogo, e deslocadas para lá as palmeiras entouceiradas que faziam o fechamento anterior. A piscina que tinha uma borda infinita derrubando a água sobre uma canaleta no antigo estreito canteiro recebeu um colchão de seixos com maiores dimensões, se adaptando à nova circunstância, para continuar transbordando e fazer o retorno da água.
O jatobá, o pau-ferro, a jaboticaba, os triplares, as cariotas que já haviam sido plantados na primeira fase já abraçam o prisma construído, ganhando as janelas do segundo piso.
Quando em um pequeno espaço de tempo todo o pensamento de um projeto que acaba de ser executado e concluído deve ser alterado por alguma razão, neste caso a anexação de um novo terreno, de alguma forma toda a relação de forças do lugar deve ser repensada para que se conquiste o equilíbrio anterior. É algo muito mais trabalhoso do que apenas quebrar o muro.
Área de intervenção 1ª fase: 700 m² / 2ª fase : acréscimo de 255 m²
Projeto e execução 2009 - 2013
The New York Times Style Magazine, agosto de 2019
Projeto Design. Ed 394 Dezembro de 2012